Da queda do Prefácio pela Folha Branca

*

Introdução Vespertina:

Disto será feito um blog. Prefaciemo-lo, então. Púnhamos-lhe uma introdução catita e brindemos à desbanda de palavras do escrevinhador. Rezemos pelo erro de escrever, pelo erro de não sermos a Folha Branca. Bebemos ao erro, subamos a montanha do erro e nos atiremos de lá a baixo. Escada a escada nos sujando da poeira da vida, sabendo que a vida suja e mesmo assim, hereticamente, certamente, rebolando na erva, nas florzinhas mimosas que serão destruídas só porque o escrevinhador resolveu levantar a pena da indecência em tom de solenidade.  Isto é existência: um erro! Mas, concomitantemente façamos dela um erro enorme, de ladeiras escarpadas, de casas caídas, de rios e de cidades. Façamos cinema das palavras e das ideias. Criemos a história ao alto e as personagens voltadas para Deus, peçamos protecção e esperemos pelo fim no sobreiro maior. Inovemos, mas não inovemos para melhor, inovemos para inovar e para errar. Erremos pelo gosto do erro. Nos sujemos por fobia ao branco, ao puro e ao cândido. Faça-se a destruição do virgem, acabem com o medo, que o sono é terminal.

(voltando à Folha)

Dela aqui será feito uma coisa pomposa, nunca menos que o luxo, a extravagância. Não há crise no mundo do sonho e da vida. Punha-se títulos barrocos, adjectivados, trocadilhos fáceis, comparações banais, analogias corriqueiras… Tudo quanto aponte para o vazio e para o nada, que é o grande destino humano e do que é humano se faz a palavra. Vamos trocar vírgulas por vírgulas, pôr vírgulas, tirar vírgulas, escrever sem vírgulas e pontos orgiacamente enfeitantes e reticências agrupadas em manifestações de afecto, juntinhas – pombas desvairas em chafarizes de cidade pequena. Deixemos que a dislexia interior nos molde o barro de caleidoscópios primorosos, deixemos que a cereja e a papaia e a maçã marquem as suas nódoas onomatopeicas de Miró.

(Azula-se o céu sobre o Prefácio. O chá quente – matutino - as bolachas - o abismo).

A dor de não se ser. Quadros de Skapinakis imensuráveis, crescendo para mim. Uma mão velha afagando a mão nova que cresce. A minha mão afagando a minha mão. Punha-se o pé direito diante do pé direito (pés direitos múltiplos, siameses de mim em surrealismo andante) e caminhe-se. Partamos direitinhos ao abismo com o chá em flute, arremesse-se as perucas setecentistas ao ar, tiremos a casaca de corte recto e faça-se o salto mortal, de peito bamboleante, carnes retesas esperando o pior, cabelo ao vento.

Tomo o último gole de chá e salto.

(Ouviste, Salto. Sim, salto.)

Salto, que do salto farei Folha Branca em degradê de esperança.

(Perdoai-me o kitsch, que não lhe resisto)

Salto no matiz da existência, no limiar de mim!

Avé 


*Quintais de Lisboa, 1956, Nikias Skapinakis

Sem comentários:

Enviar um comentário